MythBusters 5 – Odores corporais

Existe um monte de ideias preconcebidas na nossa mente, entre elas estão essas duas: brasileiro é um povo limpinho e europeus não gostam de tomar banho. Baseada em fatos reais, mas não necessariamente corretas, essas afirmações são fruto de generalização.

Ao mudar para o Quebec o brasileiro se pergunta, como será pegar o ônibus ou metrô lotado após um dia de trabalho? Como cheiram os quebequenses e os outros imigrantes que aqui habitam?

Pois então aqui vai o mito:

“Se os moradores de países frios tomam menos banho,
então no Quebec, colonizado por franceses, não deve ser diferente.”

Conceitos locais de higiene

Há mais ou menos um ano, a prefeitura de Gatineau lançou uma cartilha de boas vindas aos imigrantes. O texto dessa cartilha causou grande polêmica, porque num trecho dizia:

“Os cidadãos devem prestar atenção especial à limpeza, à higiene corporal e a salubridade dos locais públicos e privados. O respeito à qualidade de vida de outrem também diz respeito a fatores que podem ser incômodos ou inapropriados como o barulho, e odores desagradáveis como de fumaça de cigarro […] e cheiros fortes provenientes do cozimento.”

A mídia denunciou esse texto como preconceituoso e ofensivo – artigo da Radio Canadá aqui – e a prefeitura logo retirou o livreto do ar. Mas o meu amigo Google achou uma copia escondida aqui.

Qualquer um que já sentiu no corredor do seu prédio um cheiro de carniça proveniente de algum prato exótico ou quem já teve problemas com o vizinho por causa do barulho, há de concordar com os itens ali descritos, embora essa não seja uma forma educada de se dar boas vindas ao imigrante. Mas e quanto a questão da higiene corporal? Teriam os quebequenses moral para criticar os hábitos de higiene dos imigrantes?

Estabelecendo um padrão

A primeira referência que vem à mente é o número de banhos por dia (ou por semana). O problema é que numa população heterogênea esse valor varia muito. No Brasil, cujo povo se considera limpinho, há pessoas que tomam três ou quatro banhos por dia, outros se contentam com um ou dois. Mas é de consenso geral que o mínimo seria um banho por dia.

Esse consenso se expande por quase todo o continente americano, incluindo o Canadá, mas há sempre exceções. Com uma busca rápida no Google encontrei algumas discussões acaloradas em fóruns. Num tópico com o título “Banho diário: mania de americano” os ingleses defendiam no máximo três banhos por semana, uma moça relatou que sua pele e cabelo ficaram mais bonitos após reduzir a freqüência para um banho apenas por semana, um defensor do banho diário logo respondeu: “você não teve ter namorado”. Num outro fórum os franceses acusavam os quebequenses de desperdiçar água tomando tantos banhos, seria um indício de que nossos colegas locais são bem asseados.

Desodorante 48 horas!

Mas confesso que me espantei quando vi na TV um anuncio de um desodorante 48 horas. Logo no primeiro segundo pensei –  esse desodorante é feito para não “vencer” nunca – no segundo seguinte caiu a ficha – quem compra um desodorante 48 horas tem a clara intenção de ficar 48 horas sem banho! Eca! Detalhe: é um produto para o público feminino.

Mães de crianças nascidas no Quebec são orientadas a não dar banho todo o dia no recém nascido, mas apenas limpar diariamente com uma toalhinha. Banho mesmo pode ser dado a cada dois o três dias.  Por outro lado a imprensa se indignou ao saber que nos asilos para velhinhos mantidos pelo governo os idosos tinham direito a apenas um banho por semana.

Como não cheguei a conclusão nenhuma, que tal escolher outro fator de comparação?

Fator catinga

A questão é as pessoas cheiram mal nas ruas, ônibus metrô? Como grande experiência como frequentador do transporte público no Brasil e no Quebec, posso dizer que: sim e não. Como era no Brasil, a maior parte das pessoas cheira bem ou não cheira, mas tem aqueles que ao subir no ônibus o budum entra antes! Aqui é igualzinho, se trata de uma minoria barulhenta, ou melhor, fedorenta.

Minha pior experiência foi estar sentado ao lado da porta do metro quando entrou um sujeito e ficou em pé ao meu lado com o braço levantado, tive que levantar e ir para o outro lado do vagão. Alías, foi ali que tive a ideia de escrever esse post.

O sujeito do metro era certamente um local, jeito de pessoa simples, mas no meu trabalho aqueles que precisam comprar o desodorante 24h, aqueles que trazem comida fedida ou os que arrotam audivelmente a qualquer hora ou lugar – na sua cara se for preciso – são os imigrantes. Pensando bem, acho que a prefeitura de Gatineau tinha razão.

Me parece que a cultura norte americana do banho diário é mais forte que a cultura original europeia, provavelmente o mito é falso.

 

7 opiniões sobre “MythBusters 5 – Odores corporais

  1. Eu acho que o que a prefeitura de Gatineau fez não é nenhum absurdo! Afinal, as diferenças culturais existem e eles só estavam pedindo para você observar se os seus costumes não invadem o espaço do outro. O pessoal gosta de enxergar preconceito em tudo…

    Confirmando o clichê, a única pessoa no meu trabalho que cheira mal é um francês. Dizem que o problema nem sempre é a falta de banho, mas sim as roupas que não são lavadas com frequência e viram o ambiente perfeito para a proliferação das bactérias que causam o mau cheiro…
    Dos quebecas, o que eu já ouvi foi “Nossa, você escova os dentes depois de cada refeição??! Isso deve ser muito bom para a saúde!” e outra que, depois de um belo e sonoro arroto, me disse “Ops! Esqueci que eu não estava sozinha…”. Mas no geral, acho que eles são limpinhos sim…

  2. Esqueci de incluir essa no post: a propaganda do produto Colgate Total 12 aqui diz: “escovando os dentes duas vezes ao dia você estará protegido contra a placa e cárie”.. ué? No Brasil o mesmo produto requer três escovadas por dia…. k k k k

  3. Sandro, ótimo post. Mto bem humorado… adorei o fator catinga, na minha opinião o q mais vale para se chegar a uma conclusão. Aqui tbm tem o tal desodorante 48h mas eu nunca tinha pensado nele nesse sentido… ahahaha! De qquer forma já testei e não dura sequer 12h q dirá ficar sem banho 48h… mata o povo! ahahahah… Abraço!

  4. Muito engraçado seu post Sandro. O engraçado é que no Brasil muita gente acha que aqui no Canadá não se toma banho todos os dias. Eu procuro sempre dizer que a maioria das pessoas tomam sim banho todos os dias, geralmente de manhã. Mas sempre tem um ou outro que parece não ter um relacionamento muito bom com o chuveiro rsrsrs

    Eu lembro que no meu primeiro emprego em Montréal, para os novos empregados, eles davam uma folhinha com as regras de conduta, vestimenta, etc; e uma das regras era de se ter um ambiente sem odores e para isso eles aconselhavam o funcionário a tomar um banho antes de ir ao trabalho rsrsrs

    Abraços
    Fernanda

  5. Oi, Sandro! Adorei o post!

    Para começo de conversa eu não acho que o folhetinho seja preconceituoso. É normal que os padrões de higiene e barulho sejam diferentes de uma cultura para a outra e acho que é dever do governo local avisar isso. Desde que seja delicadamente, não há problema nenhum.

    Bem, eu acho que nós, brasileiros, somos um pouco histéricos com limpeza. Não que isso seja ruim, não que eu não seja histérica com limpeza também, mas temos que assumir que somos exagerados. Eu tomo 2 ou 3 banhos por dia, mas tenho que convir que esse número é exagerado para o inverno québecois…

    Além do mais, para mim, esse negócio de achar que estrangeiros fedem mais é muito coisa de brasileiro classe média-alta que nunca pegou um ônibus lotado em final de expediente aqui no Brasil. Na boa, com esse calor que faz aqui no cerrado brasiliense eu SEMPRE peguei ônibus com pessoas BEM fedidinhas, viu? Estive na França no verão e não vi nenhuma diferença dos metrôs lotados de lá para os ônibus lotados daqui: de manhã o cheiro é normal, no final da tarde tem cheiro de suor.

    Abraços,
    Lidia.

  6. Como sempre um ótimo post, meu caro Sandro! Nesse caso, pegando no calcanhar de Aquiles dos quebecas, hehehe.

    No início do contato com os colegas na ULaval eu estranhava que era o único a sair do almoço e ir escovar os dentes… Mas depois de algum tempo, acostumei em somente eu ter esse hábito entre mais ou menos 10 colegas (Romenos, Franceses, Quebecas, Marroquinos, Iranianos, Vietnamitas e Chineses). Sobre o banho, o que achei muito engraçado foi a dona da casa onde fiquei hospedado preparar um banho de imersão na banheira, com sais de banho e aromas, e depois de pronto o banho, ela ter ficado exatos 5 minutos!
    Considerando o clima, eu chegava a tomar 3 banhos por dia no verão quebequense, quando andava mais de bicicleta, e pelo menos dois banhos no inverno, porque sempre tomo um banho de manhã e outro depois dos exercícios físicos. Em relação ao odor do pessoal, ao menos em Ville de Québec, onde não há metrô, o pessoal que andava de ônibus, nos meses que o utilizei, não tive qualquer experiência que tenha me chamado atenção. Pode ser também devido aos horários que eu utilizava o ônibus, sempre evitei os horários de pico porque meu horário era flexível.

  7. Olá Sandro,

    Só para informar, o livreto polêmico de Gatineau sobre a higiene dos imigrantes, continua sendo distribuído, e com a mesma passagem.
    Aqui na cidade ainda é possível (sem maiores dificuldades) obter um exemplar.
    Mas, o grande X da questão, é o ponto de referência, se fomos comparar o Canadense médio, com o brasileiro médio, é fato que o brasileiro toma muito mais banhos que o canadense, e gostam mais de cheiros (perfumes e fragrâncias, pois canadense tem “alergia” à tudo)
    continuando na média das populações, o brasileiro e estadunidenses amam banho, e tomam com mais frequência que o canadense, que por sua vez já toma mais banhos que o europeu médio, que rivaliza com os africanos, sendo estes dois últimos adeptos do banho ecológico, ou seja rápido e bem espaçado.
    Da uma lida em um post que fiz sobre isso: O banho ou a falta dele no Canadá
    http://canadatotal.blogspot.ca/2012/06/o-banho-ou-falta-dele-no-canada.html

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